sexta-feira, setembro 21, 2007

Pinóquio

Finalmente estive no interior da baleia branca. Sempre altaneiro, este enorme mamífero dos mares exibia a graça de estar atolado numa calçada estranhamente ampla, que é o único espaço para pedestres em toda a cidade. Tem mil nadadeiras e mil caudas, e um esguicho gigantesco de água com fitas, que casa muito bem com a lua. Faz uma sombra enorme sobre aqueles que ainda se aventuram sob seu corpo diet, e, com uma língua enorme que deita ao chão, recebe a todos sentindo cócegas na garganta vermelha.

Lá dentro, o vácuo da carcaça faz um barulho que se confunde com silêncio. É o barulho das luzes, das sombras nos pilares, e dos elevadores que transportam turistas sem-noção que passam na frente da sua foto e ainda pedem pra você tirar foto pra eles. Daí você faz o imenso favor, entrega a câmera de qualquer jeito e sai deslizando pelas tripas da baleia, o que é uma das melhores sensações do mundo. Tudo é tão oco, silencioso e cuidadosamente iluminado que dá uma vontade imensa de correr para todos os cantos, numa tentativa inválida de preencher todo o espaço. É a mesma sensação de estar num hospital muito branco e grande. Lá embaixo, longas escadas fazem labirintos e conduzem a limpos banheiros (!). Frustrado diante da perspectiva de não ter encontrado nenhum tesouro, você volta para o estômago principal da baleia (sei lá, esses bichos têm estômago até no cérebro), vasculha os restos de comida, acha alguns cadávares e uns livros, desde Harry Potter até O Suicídio, passando por A Voz do Fogo e Sandman, que são leituras que eu recomendo. É aí que você lembra ser muito novo para morrer, faz cócegas no barrigão da baleia e é regurgitado com intensidade. E ainda consegue assinar o livro de visitas ("que lugar lindo :O Flávio, Brasília"). Lá fora, alguns gatos de rua caçam andorinhas estilosas, e eles ainda se mexem com elegância, para sair na foto; não se importam com seu estado deplorável, algas e sal no cabelo.

Dias depois, repete a dose com uma menina sensual de shortinho, que se deixa iluminar, como a Virgem, no âmago mais surrealista da baleia. Encontra colegas e faz amigos, toma sorvetes, e faz caridades. E fica com saudades da baleia.

3 comentários:

Flávio A disse...

nunca mais tento colocar uma fonte serifada no texto. sei que é mais confortável, mas só verdana daqui pra frente. eu demorei meia hora pra fazer o blogger entender qual era a maldita fonte que eu queria.

Unknown disse...

é, essa fonte ficou meio nada a ver com a baleia. tinha que ser uma mais gooorda.
mas tá bom assim também. xD
eu não conheço a baleia. vc vai ter de me levar lá um dia =)
(sem bochechas, de preferência)

Flávio A disse...

engraçado, no outro pc a fonte ficou normal... mas que coisa.
O.o