segunda-feira, janeiro 26, 2009

Registro sonoro

Escute o registro sonoro e responda às perguntas seguintes.

Tin tin tin *musiquinha*. Unidade 11, o dinheiro a qualquer preço. Banco!, página 146. Ganhar dinheiro é bom, mas gastá-lo é melhor ainda. Então, e vocês... o que vocês fariam se fossem milionários?
Se eu fosse milionário? Hmm... eu compraria uma grande mansão, eu faria muitas viagens e...
A gente nunca sabe. Mas eu acho que eu doaria tudo para, é..., para as crianças que são infelizes, sei lá, na África ou para associações na França.
Eu, eu teria a possibilidade de criar minha própria empresa. Et aí eu... eu daria um pouco para meus pais, meus amigos.
Trocar meu carro que não funciona mais. E... é isso! Meu conforto em primeiro lugar.
Eu, eu alugaria uma mansão formidável no litoral... e... com sol, e convidaria todos os amigos, todas as namoradas e faríamos, hmm, uma festa inacreditável durante uma semana, um mês, todo mundo dançando sem dormir, com uma piscina, e muitas belas mulheres molhadas e peitudas dentro da piscina. Ééé! E depois, depois, bom, eu faria uma viagem, uma boa viagem, ah sim sim, dois meses, três meses, eu faria a volta ao mundo, sim, sim, gastando e gastando todo o dinheiro.
Como vou me casar, eu faria um casamento superhipermegablastergrande. Eu aproveitaria para comprar o vestido mais belo do muuuuuuuuundo!, um vestido de um famoso costureiro, coisa fina. Aí depois, sei lá, talvez nos casaríamos na Notre-Dame de Paris e aí, bom, sei lá, aí alugaríamos o último piso da Torre Eiffel para fazer a recepção, e os convidados que não trouxessem presentes caros seriam jogados lá do alto. Convidaríamos todo o mundo, o mundo inteiro mesmo. E depois faríamos uma grande festa durante toda a noite com um supergourmet que nos faria umas comidas megabelas e extremamente hiperelaboradas. É isso, eu acho que faria isso.

terça-feira, janeiro 20, 2009

Retratos pitorescos

Chego cedo, estaciono mal entre dois carros mal estacionados, um Honda Fit e um C3 da Citröen. Todo dia é a mesma coisa, uma ginástica no volante para acertar o carro na vaga, enquanto mil e um carros vão se alinhando atrás de mim, e no final todos os carros ficam mal estacionados. Alguns motoristas estacionam TÃO mal que dá vontade de riscar os carros deles inteirinhos! Mas isso não convém no momento. O fato é que do meu lado direito existe um rosto, um rosto dentro do carro. Uma cabeça angulosa emoldurada por um cabelo liso e preto, escorrido. A pele do rosto é morena, e provavelmente a do resto do corpo também (é claro). É uma mulher, uma moça. Enquanto ajeito o carro na vaga, desistindo logo no começo, porque não adianta mesmo, a moça rói as unhas, ansiosa. Já fumou vários cigarros, ali dentro mesmo. Deve estar esperando o começo das aulas. E todo dia é a mesma coisa, tanto quanto os carros tortos no estacionamento. Ela senta no mesmo lugar, cruza as pernas do mesmo jeito, e os olhos das outras pessoas fazem assim: começam pelo topo de sua cabeça, admiram seu cabelo preto e escorrido, depois se chateiam com seu rosto sempre mal-humorado, chato e impaciente, depois descem pelo corpo bem vestido, alinhado, elegante, asseado, com braços tatuados, os dois braços são tatuados, depois voltam às orelhas quando percebem que ali existe um alargador roxo, depois descem de novo até os pés, sempre cobertos por um sapatinho de plástico. De plástico porque ela é vegana, como faz questão de comentar em algumas aulas. Veganos não se vestem com pele de animais, nem frequentam açougues (em francês, a palavra boucherie significa açougue, e também carnificina). Mas ela está sempre descontente, impaciente, vidrada no relógio como se o tempo passasse lentamente, mais devagar que em Oslo. O tempo corre superdevagar em Oslo, ou melhor, não corre, rasteja. Então, o tempo para essa moça rasteja. E quando ela fala, é como se ela jogasse todas as suas ansiedades para fora, suas palavras são loucas, arremessadas, rápidas, hesitantes, trepidantes porque tropeçam de sua boca para o ar. Seu francês tem um sotaque rascante e quase dinamarquês, ou melhor, é totalmente Dinamarca, e ela fala de veganismo, freeganismo, especismo e a derrocada das gerações anteriores. E quando a vemos dentro do carro enquanto ajeitamos o nosso próprio carro na vaga, ela, roendo as unhas, desliza o olhar para o lado, sorrateira, tentando enxergar, mas ela não sabe que nós a estamos vendo, não sabe que a estamos comparando a um índio xavante. E quando giramos o volante no sentido contrário para alinhar o carro, ela volta os olhos para frente, e ali tritura todas as suas ansiedades.

Redação de prova

Existe uma diferença entre aqueles que mendigam na rua e as pessoas que tocam música em lugares públicos para ganhar dinheiro? Argumente, utilizando os conectores que exprimem contradições e os pronomes relativos.

Sempre existem diferenças e semelhanças entre as pessoas que mendigam e aqueloutras que tocam música na rua, por exemplo, para ganhar dinheiro, embora o objetivo delas pareça o mesmo. As origens delas podem ser as mesmas: elas podem ser refugiados políticos, ou então vítimas de algum desastre, talvez tenham perdido seus empregos, suas casas, suas famílias. Mesmo que muitas vezes essas pessoas sejam vistas como tendo necessidades e histórias de vida iguais, e mesmo que elas tenham os mesmos objetivos (ganhar dinheiro), existem nuances que fazem a diferença.

Mendigos geralmente contam histórias tristes ou trágicas, no intuito de chamar a atenção e sensibilizar. Instrumentistas, pelo contrário, tocam músicas pelas quais serão recompensados em dinheiro. Existe uma diferença entre dar dinheiro a alguém porque sentimos pena e recompensar o trabalho de um músico talentoso.

O filósofo Charles Peirce, que estudava a significação, a representação e as diferenças entre dois ou mais significados em uma rede de signos, criou o pragmaticismo, um método que permite estudar essas diferenças a partir das ações que envolvem esses signos. Segundo este método, o signo é definido pelo seu hábito, isto é, pela ação que produz. O pragmaticismo nos ensina que mendigar é diferente de tocar música, por mais que o objetivo seja o mesmo, simplesmente porque as ações produzidas por esses atos são diferentes.

Agora imagine. Se mendigar e tocar um instrumentinho ali fossem realmente a mesma coisa, o mundo seria uma bagunça, todos os mendigos iam tocar flautas, clarinetes, tambores e oboés, e como as pessoas têm gostos diferentes, cada um tocaria uma coisa. Uma marchinha ali, uma valsa acolá, cá uma polca, mais adiante um forró, e a rodoviária de Brasília seria muito, muito pior do que já é. Ainda bem que os instrumentistas são tímidos e melancólicos, e ainda bem que há outros que apenas contam histórias por aí.

terça-feira, janeiro 13, 2009

Mais aplausos! Mais!

O nome da música já é genuíno, a personagem é risível, e a cena, ridícula. As gozações que apareceram na internet não poderiam ser menos engraçadas. Com uma novela dessas, quem precisa de Madonna?



que beijinho doce que ele tem
depois que beijei ele
nunca mais andei ninguém

que beijinho doce
foi ele quem trouxe de longe pra mim
meu braço apertado, um suspiro dobrado
que amor sem fim...


Mais aplausos, gentalha!

sexta-feira, janeiro 02, 2009

Luciana Gimenez no meu quadrado

Se 2008 foi o ano da macumba, 2009 não poderia ter começado pior.

A história iniciou-se com um bruto enjoo no estômago, que me acompanhou durante toda a viagem e foi dar resultados apenas quando cheguei em casa: vômitos e mais vômitos. Qualquer coisa que eu colocasse corpo adentro, inclusive água, era rejeitado pelo estômago, que doía de tão fortes contrações. Quando cheguei a um nível considerável de desidratação, com garganta seca e um deserto por dentro (e febre), achei que era melhor tomar uma providência - foi quando também meus pais começaram a ter os mesmos sintomas que eu.

Foi aí que fomos todos ao hospital, às 22h do primeiro dia do ano. Ainda enjoado, sentei na sala de espera e vi um filme ruim do Didi, enquanto meus pais faziam a parte burocrática. Demorou. Depois, fomos atendidos pela médica: um de cada vez, pra não virar farra. O diagnóstico parecia tender para uma infecção alimentar, talvez por salmonella, o que foi confirmado logo em seguida pelo exame de sangue, que fizemos todos no hospital mesmo. A enfermeira que tirou o sangue talvez estivesse muito cansada por causa do ano novo, e errou a agulha na veia da minha mãe umas 3 vezes. Estresse.

Mas a parte legal vem agora: enquanto o resultado do exame não saía, fomos conduzidos a uma salinha com poltronas que pareciam divãs, onde nos seria ministrado soro na veia. Que emoção, nunca tomei soro na veia antes! Ainda mais assim, com a família toda. Um programão. Minha mãe, posuda, com seus colares e pulseiras, prostrou-se numa poltrona ao meu lado e deixou bem claro que tinha medo daquelas coisas entrando no corpo dela. "Moça, se eu não quiser mais, você vem aqui e tira, certo?". Era um frasco grande de soro, e outro menor de algum remédio para o estômago, mas a enfermeira insistia em não esclarecer o que era. Enquanto minha veia era preparada para receber os estranhos líquidos, olhei para o lado e contemplei a figura paradoxal de minha mãe recebendo soro na veia. Nunca achei que fosse vivenciar isso. Quase a chamei de pinguça.

Então finalmente penetraram uma agulha em meu braço, e eu vi o sangue saindo de-va-gar-zi-nho, e depois o soro finalmente entrando. A picada da agulha doeu, mas percebi que eu realmente não tenho pânico dessas coisas. Todos aqueles canudos de borracha, o líquido escorrendo lentamente até desbravar o meu braço, o meu corpo, todas aquelas pequenas válvulas verdes de plástico que conntrolavam a entrada do soro... tudo me pareceu muito robótico. Legal, gostei.

Só que na salinha onde estávamos (e meu pai fora levado para outra, para o desespero de minha mãe), havia uma televisão sintonizada no programa da Luciana Gimenez. A única coisa que passou foi uma banda (?) de funk com muitas mulheres popozudas de calça branca, que mostravam os fundos para a câmera. Mulher melancia, mulher abacate, maçã, morango, pêra, banana, uva... todos os tipos de mulheres, para todos os gostos. E quando a banda terminava uma música, sempre com letras instrutivas e que faziam minha mãe se remexer desconfortavelmente na poltrona, a Luciana Gimenez comentava algo como "que legal!, e a mulherada dançando, hein?", e fazia uma pergunta boba. Os vocalistas respondiam, e ela dizia "que legal!". Deve ser fácil ser a Luciana Gimenez: é só ficar o programa inteiro dançando e repetindo "que legal, que legal", acrescentando um comentário ou outro, mas não precisa ser nada geniaaaal não. O ápice da história foi quando a Luciana convocou ao auditório aquela brilhante artista que compôs a dança do quadrado, e aí o nível baixou: "agachamento no seu quadrado, agachamentonoseuquadrado, eita que a mulher melancia deve fazer muito esse!". Minha mãe enfartou. E eu estava quase me torcendo de rir com os pulos desajeitados das popozudas dançando em seus minúsculos quadrados, e torcendo para que o peito de uma delas pulasse para fora da roupa e a Luciana dissesse "que legal!".

Até que um médico gente fina apareceu e perguntou se estava tudo bem, e eu tomei coragem e disse "sim, menos a televisão!" "quê?" "menos a televisão!" "ah tá, mas também... que péssimo". O médico mudou para a Globo, que passava um drama americano chamado Dança Comigo?, que é uma refilmagem de uma comédia japonesa chamada... Dança Comigo?. Os americanos fazem com o cinema japonês o que os japoneses fazem com a tecnologia produzida no resto do mundo: copiam, patenteiam e vendem como se eles tivessem inventado. Em geral, as versões originais, japonesas, são melhores. Dança Comigo? não foge à regra, e é divertidíssimo. Recomendo.

A noite terminou com o soro inteiro entupido nas veias. O estômago melhorou, a disposição melhorou, e tudo há de ser melhor quando os antibióticos derem um fim às salmonellas. Só passei a última noite em claro.