Se 2008 foi o ano da macumba, 2009 não poderia ter começado pior.
A história iniciou-se com um bruto
enjoo no estômago, que me acompanhou durante toda a viagem e foi dar resultados apenas quando cheguei em casa: vômitos e mais vômitos. Qualquer coisa que eu colocasse corpo adentro, inclusive água, era rejeitado pelo estômago, que doía de tão fortes contrações. Quando cheguei a um nível considerável de desidratação, com garganta seca e um deserto por dentro (e febre), achei que era melhor tomar uma providência - foi quando
também meus pais começaram a ter os mesmos sintomas que eu.
Foi aí que fomos todos ao hospital, às 22h do primeiro dia do ano. Ainda enjoado, sentei na sala de espera e vi um filme ruim do Didi, enquanto meus pais faziam a parte burocrática. Demorou. Depois, fomos atendidos pela médica: um de cada vez, pra não virar farra. O diagnóstico parecia tender para uma infecção alimentar, talvez por
salmonella, o que foi confirmado logo em seguida pelo exame de sangue, que fizemos todos no hospital mesmo. A enfermeira que tirou o sangue talvez estivesse muito cansada por causa do ano novo, e errou a agulha na veia da minha mãe umas 3 vezes. Estresse.
Mas a parte legal vem agora: enquanto o resultado do exame não saía, fomos conduzidos a uma salinha com poltronas que pareciam divãs, onde nos seria ministrado soro na veia. Que emoção, nunca tomei soro na veia antes! Ainda mais assim, com a família toda. Um programão. Minha mãe, posuda, com seus colares e pulseiras, prostrou-se numa poltrona ao meu lado e deixou bem claro que tinha medo daquelas coisas entrando no corpo dela. "Moça, se eu não quiser mais, você vem aqui e tira, certo?". Era um frasco grande de soro, e outro menor de algum remédio para o estômago, mas a enfermeira insistia em não esclarecer o que era. Enquanto minha veia era preparada para receber os estranhos líquidos, olhei para o lado e contemplei a figura paradoxal de minha mãe recebendo soro na veia. Nunca achei que fosse vivenciar isso. Quase a chamei de pinguça.
Então finalmente penetraram uma agulha em meu braço, e eu vi o sangue saindo de-va-gar-zi-nho, e depois o soro finalmente entrando. A picada da agulha doeu, mas percebi que eu realmente não tenho pânico dessas coisas. Todos aqueles canudos de borracha, o líquido escorrendo lentamente até desbravar o meu braço, o meu corpo, todas aquelas pequenas válvulas verdes de plástico que conntrolavam a entrada do soro... tudo me pareceu muito robótico. Legal, gostei.
Só que na salinha onde estávamos (e meu pai fora levado para outra, para o desespero de minha mãe), havia uma televisão sintonizada no programa da
Luciana Gimenez. A única coisa que passou foi uma banda (?) de funk com muitas mulheres popozudas de calça branca, que mostravam os fundos para a câmera. Mulher melancia, mulher abacate, maçã, morango, pêra, banana, uva... todos os tipos de mulheres, para todos os gostos. E quando a banda terminava uma música, sempre com letras instrutivas e que faziam minha mãe se remexer desconfortavelmente na poltrona, a Luciana Gimenez comentava algo como "que legal!, e a mulherada dançando, hein?", e fazia uma pergunta boba. Os vocalistas respondiam, e ela dizia "que legal!". Deve ser fácil ser a Luciana Gimenez: é só ficar o programa inteiro dançando e repetindo "que legal, que legal", acrescentando um comentário ou outro, mas não precisa ser nada geniaaaal não. O ápice da história foi quando a Luciana convocou ao auditório aquela brilhante artista que compôs a
dança do quadrado, e aí o nível baixou: "agachamento no seu quadrado, agachamentonoseuquadrado, eita que a mulher melancia deve fazer muito esse!". Minha mãe enfartou. E eu estava quase me torcendo de rir com os pulos desajeitados das popozudas dançando em seus minúsculos quadrados, e torcendo para que o peito de uma delas pulasse para fora da roupa e a Luciana dissesse "que legal!".
Até que um médico gente fina apareceu e perguntou se estava tudo bem, e eu tomei coragem e disse "sim, menos a televisão!" "quê?" "menos a televisão!" "ah tá, mas também... que péssimo". O médico mudou para a Globo, que passava um drama americano chamado
Dança Comigo?, que é uma refilmagem de uma comédia japonesa chamada...
Dança Comigo?. Os americanos fazem com o cinema japonês o que os japoneses fazem com a tecnologia produzida no resto do mundo: copiam, patenteiam e vendem como se eles tivessem inventado. Em geral, as versões originais, japonesas, são melhores. Dança Comigo? não foge à regra, e é divertidíssimo. Recomendo.
A noite terminou com o soro inteiro entupido nas veias. O estômago melhorou, a disposição melhorou, e tudo há de ser melhor quando os antibióticos derem um fim às salmonellas. Só passei a última noite em claro.