
É o que sempre disse: gente bonzinha só se *. Eu não deveria ter aceitado seu convite para uma conversa, não deveria ter começado com aquele email. Você soube arquitetar a conversa muito bem e eu nunca imaginei que a evasão custasse tanto jogo de cintura. Mas eu poderia ter aceitado, pelo gosto culposo da aventura. Poderíamos fingir que nos esbarramos lá por acaso. Entraríamos na mesma sala, e você gripado fungaria como uma porca enjaulada, o frio do ar-condicionado descendo espiralado como um perfume envenenado, querendo que nos agarrássemos. Agarraríamo-nos com as mãos, apenas, sua mão quente aquecendo a minha. Visualizaríamos essa cena em plano-detalhe, como um dos muitos planos-detalhes que transbordam nesse filme do Quebec, e como é impossível entender o sotaque do Quebec. Seria somente nesse ponto, porém, banhado pela luz da tela, que eu poderia perceber: nada disso aconteceu, eu não aceitei, eu recusei depois de muito pensar e o que me levou a sentar sozinho naquela sala foi o fato de eu ter dado meu primeiro toco.